Ao chegar de manhã cedo,
no ônibus do Pedregal,
assustou-se Serafim,
pois não via ou via mal:
em seu lugar costumeiro
havia uma ausência total:
Cadê a Rodoviária?
Sumira sem deixar sinal.
Não havia nem coluna,
nem escada, nem beiral.
Sumiram-se pontos de ônibus,
do branco, nem o cal.
Não havia nem o chão,
por onde os Eixos passavam.
Tudo era um sumidouro,
que a todos abismava,
mas ao abismo profundo,
ninguém um paso arriscava.
Cadê as pastelarias?
Onde as bancas de jornal?
Sumiu-se a livraria,
caiu trânsito e sinal.
Evaporou-se o mármore,
no buraco abissal.
E, na cabeça de Serafim,
a pergunta sem resposta:
Onde vou engraxar sapatos?
Estou com a caixa nas costas.
Não tenho onde me acostar,
não há vão escada ou porta.
Os ônibus já recuam;
a fila não mais se acaba.
Dos quatro cantos, quem disse
que há qualquer retirada?
Não há como ir adiante,
para trás, ninguém se abala.
Na ponta Norte do Eixo,
já se alcança Sobradinho.
Ao Sul, no Bandeirante,
ninguém tira fino.
A Leste, na L2,
mover-se é um desatino.
A Oeste, no Cruzeiro,
não passa nem um menino.
E das pontes atravessadas
do Lago, nem se bulindo.
Sumida a Rodoviária,
num buraco sem destino.
Como vou vender balinha,
mesmo com essa multidão?
Não há sinal de parada,
ninguém me presta atenção.
Tudo virou o buraco,
escavado aqui no chão.
E, à noite, como dormir?
Onde estender o colchão?
Serafim e seus colegas,
roubados de seu rincão.
Como acender a fogueira,
das tábuas de algum caixão?
Onde foi essa danada,
que no chão sempre esteve?
Quem a terá roubado,
e onde foi que a reteve?
Será que ainda volta?
Ou pro céu se foi, bem leve?
João Bosco Bezerra Bonfim
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